Balelas (ou não) da Rua

Nem tanto ao Mar, nem tanto à Terra

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Respira-me

Ligas o carro, está frio, o bafo do cigarro confunde-se com o da vida, devagar, lento, em cada bafo, um gelar interno até às vísceras da alma, e paras, respiras mais vagarosamente, em cada bafo o universo inteiro, fragmento, nublado, denso, confuso, a ir pelas janelas fora, revestindo o vidro de uma pequena película opaca, estás só, o mundo não te vê, e aceleras finalmente. Pões a primeira, a segunda, até à quinta o primeiro cigarro se vai e a música acende, não sabes para onde vais mas sabes onde não ficas mais, o caminho descobre-se com a viagem e o passado acaba-se no tempo, és livre, finge e cala, consente, deixa e vai, segue só, sem malas de viagem nem telefones guardados, apagas as fotografias e os papéis já reescritos, a tua história começa agora. Ficou na portagem o último sorriso, um último Obrigado, Ouves-me?, Falo contigo?, e ninguém responde, não queres falar, apenas em sonhos. Do outro lado do mundo, da outra margem do rio, para...
Olá, perdi-me outra vez, a pior parte é não haver mais ninguém a culpar, não haver mais nada a recordar, embrulha-me em sonhos e envia-me para o mundo, não preciso, não aqueço, não sei, respira-me.
Perder-me outra vez, mais longe, sabendo que te encontro quando nós quisermos, não me perco de ti, não fujo de nós, um dia o longe vai ser demasiado perto para fugir, demasiado calado para ter voz. Nesse dia, tudo fará sentido, nada será verdade.