A cidade enche-se de nevoeiro, ocultando em pequenos abraços a piedade das luzes que, devagar, se deixam embalar nele, plácidas, secas. E a noite cai na cidade, cedo, devagar. Uma a uma, as janelas despedem-se, acenando as horas até ao dia as vir beijar, devagar. O menino deita-se nos seus lençóis frios, baixinho, sozinho, dorme.
Recebe o medo, devagar, deixa-o vir contigo se deitar, cantar a última deixa do dia, baixinho, sussurrando, trazendo um pouco do nevoeiro com ele, um pequeno gosto da cidade. Não desvendes os dias, deixa as horas o encantarem, levarem para lá do horizonte onde o homem não vê, onde o tempo não sente, não deixes de sonhar.
Fecha os olhos e aperta as mãos ao peito num ligeiro sufoco, não tenhas medo, um dia na madrugada viras no reflexo do sol o rosto dourado de quem o olha, as mãos hirtas de quem o pega e a voz alta de quem traz o silêncio consigo, de quem dormiu com a companhia que não tem, com a gente que não traz.
Se um dia, na cidade, vires o nevoeiro, sorri, é apenas o medo a sonhar, a brincar aos países, deixa o embalar a cidade enquanto te embalas no medo. Não deixes de sonhar, a cidade é o mundo da luz que vem todas as madrugadas.
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