Balelas (ou não) da Rua

Nem tanto ao Mar, nem tanto à Terra

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Eugénio de Andrade - a 5 anos de Distância


Passamos pelas coisas sem as ver, gastos, como animais envelhecidos: se alguém chama por nós não respondemos, se alguém nos pede amor não estremecemos, como frutos de sombra sem sabor, vamos caindo ao chão, apodrecidos.

Ainda sabemos cantar, só a nossa voz é que mudou: somos agora mais lentos, mais amargos, e um novo gesto é igual ao que passou.

Devias estar aqui rente aos meus lábios para dividir contigo esta amargura dos meus dias partidos um a um - Eu vi a terra limpa no teu rosto, Só no teu rosto e nunca em mais nenhum

Ter só dedos e dentes é muito triste: dedos para amortalhar crianças, dentes para roer a solidão, enquanto o verão pinta de azul o céu e o mar é devassado pelas estrelas. Porém eu procuro-te. Antes que a morte se aproxime, procuro-te. Nas ruas, nos barcos, na cama, com amor, com ódio, ao sol, à chuva, de noite, de dia, triste, alegre — procuro-te.

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